Pensa, meu filho, pensa!
Devem ter notado que tenho voltado ao tema sobre o futuro. É verdade. Se
ontem comentavam que eu me restringia às emoções e vivências do passado, porque sou
mesmo saudosista, hoje tenho me dedicado ao tema que mais me inquieta e que, na
minha concepção, é o "Presente". Se fosse escrever aos moldes da
linguagem das redes sociais, eu diria: Da série:- Percepção do futuro. Para ser
mais divertida, poderia ser: Da série – Caiu a ficha, ou : Da série - Olhe quem
entrou em sua casa...
O interessante é que as
pessoas mais antigas até se surpreendem com o que têm visto, o que já não
acontece com as crianças e jovens, porque são fruto da filosofia da imediata
resposta, dos fundamentos do "Não me faça pensar*". Diferentemente, sou da época da necessidade peremptória de
ter que pensar. E pensar muito. Ou melhor, sou da fase de transição, de um
século a outro e suas maravilhas e surpresas, o que exige mais esforço para
adaptação às novidades. Coisas, aliás, já antecipadas nas conversas de meu
velho pai: meus filhos, vocês verão coisas que nem imaginam. O homem vai
arrastar o mundo com a ponta do dedo; vai se desintegrar aqui e se materializar
em outro lugar; vai ler pensamento e atravessar as paredes, vai ser operado sem
cortes, vai ter peças de reposição, vai ver e ouvir pessoas do outro lado do
mundo, em tempo real... Naquela ocasião eu achava que aquele discurso era uma
questão de retórica, para nos motivar a estudar e buscar com otimismo o que
viria. Era, com certeza um visionário, porque descrevia o mundo que ele não
conhecia e que estamos vivendo agora. Se a nossa infância e juventude foram
recheadas de autores, filósofos e Enciclopédias, hoje as tecnologias são
desenvolvidas de modo tal que a criança, mal saída do berço, sabe arrastar um
ícone no tablet e abrir as portas do mundo, sem nenhum esforço. Já nascem com a
chave nas mãos.
A evolução é, sem dúvida
nenhuma, uma viagem sem volta. Estamos a caminho de uma mudança, inclusive física,
em que seremos mais cabeça; testa enorme e imensos olhos; partes do corpo mais
utilizadas e por isto com maior probabilidade de redefinirem o rosto de nossa
espécie. Em contrapartida, braços e pernas hão de atrofiar pelo desuso.
Entre tudo o que se
espera acontecer, ainda nos surpreendemos com aqueles que envelheceram. Apesar
da idade, continuam em seu propósito de participar desta evolução efetivamente,
mesmo que sacrifiquem o pouco de vida que lhes resta. São pessoas especiais que
desejam contribuir para o progresso da humanidade.
A primeira cosmonauta da história, a
russa Valentina Tereshkova, manifestou seu desejo de voar a Marte, com uma
passagem só de ida, por ser um projeto economicamente mais viável. Valentina
tripulou um voo a bordo do foguete Vostok 6 em 1963 e ainda se mostra disposta
a uma viagem sem volta, sem se preocupar com a duração, com a radiação e com
tudo que deixaria para trás. Seria uma doação definitiva de experiência, conhecimento,
corpo e alma.
Dois anos após o
desastre nuclear no Japão, apenas os idosos voltam para áreas evacuadas ao redor
da usina avariada, apesar dos trabalhos de descontaminação dos campos. Eles se
oferecem como cobaias para estudar a resposta do corpo no terreno contaminado.
Mesmo com a idade avançada e com o comprometimento da própria saúde, sonham trazer
sua cidade de volta à vida, por amor à terra natal. Cada pessoa que resolve
voltar à área do desastre recebe um dosímetro que registra a tensão radioativa
atual e acumulada. Isto me parece uma bomba-relógio, pronta a explodir. Eles
não se importam. A grande maioria acredita que a entrega de sua vida se justifica
na garantia da vinda e sobrevivência dos que ainda nascerão. E, o que mais os
idosos lamentam é não mais ouvirem as vozes das crianças.
A aposentada do Japão espera
a chegada da primavera, apesar da radiação dos campos e da ausência dos filhos
e netos. A cosmonauta russa sonha com uma viagem sem volta a Marte, como
precursora de um projeto de colonização do planeta tão distante. Enfim... Infância,
juventude, velhice; tudo é uma questão de tempo, ou de ilusão do tempo e do
espaço. Em um momento qualquer, em um lugar indefinido, todos acabam se
encontrando e o que parece o fim é simplesmente o começo.
Pensando bem... Não me
surpreenderia se visitantes intergaláticos atravessassem as paredes de minha
casa.
Valéria Áureo
13/06/2013
.* Não me faça pensar- O livro mais procurado sobre usabilidade no
mundo. Steve Krug consegue convencer, desde os designers mais recalcitrantes,
aos executivos insensíveis ao comportamento do usuário, que usabilidade deve
ser levada em consideração. O mote é que a interface deve ser tão óbvia, que o
usuário não precise ficar parando para raciocinar ou pensar como usá-la.
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