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sexta-feira, 14 de abril de 2017

Epifania



Ele era um homem muito simples. Tão simples que nem vou dizer o seu nome. Homem honesto, trabalhador e dedicado à família. Amava a mulher com todas as suas possibilidades; era entrega total, absoluta, de corpo e de alma. Era um homem feliz. Ele navegava em sentimentos profundos, apesar de não compreender muito, nem o que falava, nem o que lia. Amava especialmente as palavras. E, tão cheio de palavras bonitas ele ficou, que nem temia os sentimentos rasos de quem ria. Era de uma ousadia incompreensível quando falava. Muitos amigos achavam bonito; alguns poucos, não.
Para a esposa ele passou a repetir, de uma hora para outra: estou tão feliz!... Meu amor é uma epifania! E, a cada momento de prazer ou de pequena alegria dizia: meu amor é epifania!
E-pi-fa-ni-a!
A mulher encheu-se de espanto. O que é isso?
Ele passou a existir em um estado profundo de realização, compreendendo a essência das coisas. A deliciosa sensação de estar tudo solucionado, esclarecido na vida o deixava pleno, sublime; isso o fazia completo: meu amor é epifania!
A mulher encheu-se de medo. Epifania?
Ele passou a sentir uma manifestação divina em tudo o que fazia. Não podia conter a leveza de seu espírito, de tão feliz. E repetia... Meu amor é epifania!
Quanto mais ele falava em epifania, mais a mulher se afligia! E, da epifania dele, nasceu todo o espanto dela. Começou a chorar, a sofrer e a viver a tragédia da certeza de ser traída; ela não conseguia mais superar esse novo espanto da vida. Epifania! E, da certeza dela de ser traída pela epifania, ela o abandonou sem qualquer explicação. Em mais um dia de proclamação à epifania, ela arrumou as malas, nada disse, nada escreveu e partiu.
Ele, que vivia feliz, em êxtase, em epifania, começou a experimentar a dor do abandono. E, da epifania foi à agonia.


Autora: Valéria Áureo

Rio, 14 de abril de 2017