Apresentação

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domingo, 22 de maio de 2016

Segunda Sessão









- Voltei , doutor...

- E passou pela sua cabeça não voltar mais?

- Sei lá. São tantas as adversidades. Eu poderia não poder vir, não querer vir, ser impedido de vir, não gostar de vir... Eu ficar com preguiça, chover forte, ficar sem dinheiro para pagar a consulta!... Sim, falta de dinheiro, é um grande motivo, não é? Entendeu?

- Bom, onde paramos?...

- A melancia. Tenho pensado na melancia.

- A fruta, certamente.

- Talvez! Para cada situação, uma possibilidade. Estou fazendo novas conexões para lidar com cada circunstância. O bom é sempre diminuir o senso crítico, como dar uma pirueta no meio do escritório, por exemplo e, para complicar, carregando uma melancia. Não tenha medo do ridículo é o que penso. Todo mundo, em algum momento é ridículo. Todo mundo carrega uma melancia; visível ou invisível aos outros, sempre há uma melancia. Já imaginou?... Uma professora fazendo striptease em uma aula de filosofia, matemática?Ela e a sua melancia...

- Aonde o senhor quer chegar?

-A lugar nenhum. Estou ainda na questão da melancia, ou do improvável, ou do absurdo; já lhe disse que a minha cabeça é cheia de ideias e não para. Hoje estou detido na melancia de cada um. Da melancia eu passo ao abacaxi em um minuto. Ou melhor; o problema da melancia é como um abacaxi. É tão complicado carregar a melancia quanto descascar o abacaxi. Bom, o abacaxi eu até descasco muito rapidamente. Acho bem mais fácil. Já a melancia é maior e mais pesada...

- De certa forma. Continue!

- Pois é. O sujeito carregando uma melancia já é um problema. Se estiver descendo uma escada com a melancia? Também imagino que possa pegar fogo no prédio. Se tiver um incêndio, enquanto se desce a escada carregando a melancia...

Não pode descartar a melancia?

- Depende! E se a melancia não for só para o sujeito aparecer, mas uma questão de sobrevivência? Não é uma melancia que o sujeito pendure no pescoço, entende?Esta é a metáfora mais banal para a melancia. Eu falo de uma melancia que pesa dentro da cabeça, no coração, nos braços. É uma melancia que não se pode descartar. Ninguém também pode ajudá-lo a carregar, porque ele tem que fazer isto sozinho.Cada um carrega a sua.

Sim. Compreendo. E tem que levar a melancia para onde?

-Aí é que está! Se o sujeito não sabe nem para onde vai, como vai saber para onde levar a melancia? Não se sabe como e nem onde. Já lhe disse: pode ser que ele tenha que descer uma escada, doze andares, porque há um incêndio no prédio... E carregando a melancia.

- Bom. Tem que decidir se leva ou não a melancia!

-A melancia vai. Onde ele for a melancia vai!Ele poderia improvisar e imaginar várias possibilidades, como é necessário na vida: carregar a melancia, partir a melancia, esconder a melancia, guardar a melancia, jogar fora a melancia. Só não pode passar adiante a melancia...

-Então? O que resta fazer?

-Acho melhor ele partir e comer a melancia.

- Pois vamos tratar disto aqui. Aqui é o lugar certo.
- Como?Vai fatiá-la, por acaso?

- Tem outra sugestão? Pode engolir a melancia inteira? Não é possível, não é? Nem inteira e nem toda de uma vez. É preciso ter paciência, pois essas coisas demoram. Está disposto a resolver esse problema? Vamos partir a melancia para se comer uma fatia a cada vez da semana. Só assim vai se dar conta, ao final, de que ela é doce, refrescante e agradável.

- Pior para mim, que não suporto melancias! Prefiro descascar abacaxis. Estou me sentindo ridículo!