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quinta-feira, 11 de julho de 2013

DANDO NOME AOS BOIS



Dando nome aos bois...



                                                Ilustração: Internet

         

Alguma coisa acontece nas nossas cidades. Parece que as manifestações de massa ressurgiram num passe de mágica e que, de uma hora para outra, as pessoas resolveram expor as suas ideias, depois de anos de silêncio. Mas de onde partiu esta intenção de tomar consciência das questões sociais até então esquecidas?
           Entre outras coisas, partiu de um meme da Internet que representa o conceito de muitos usuários de comunidades online pulsando em sintonia, como um cérebro global .Esses usuários se denominam “ Anonymous. Por trás dos anonymous estão universitários e estudantes de ensino fundamental, segundo um analista de ciência política. As demandas são difusas, sem conexão institucional e a mola propulsora das reivindicações é a qualidade de vida e o uso do dinheiro público de forma clara.
          “Na sua forma inicial, o conceito Anonymous tem sido adotado por uma comunidade online descentralizada, atuando de maneira coordenada, geralmente em torno de um objetivo livremente combinado entre si e voltado, principalmente, a favor dos direitos do povo perante seus governantes”. O coletivo Anonymous tem alcance local, internacional e dimensão global, conseguindo capturar indivíduos de todos os extremos do planeta, enlaçados nas grandes redes sociais, que fazem do globo uma pequena bola de gude. E, bola de gude é para brincar. Aproveitando o momento, eu  diria que é uma bola de futebol. Aliás, já vimos um sujeito que brincou com o globo terrestre, como se fosse uma bola, lembram-se?* Alguns podem extrapolar e querer se divertir com a bola outra vez... Sim, de um clamor virtual a uma multidão aglomerada no mundo real, existe uma grande distância. A brincadeira pode acabar mal. O grande cérebro não pode controlar os milhares impulsos dos manifestantes desgovernados, porque cada indivíduo se liberta dele e passa a agir por conta própria.
           Não existe um comando único, mas um coletivo em ação. Não há nada que possa garantir a harmonia de cérebros disseminados em milhares de lugares, agindo por vontade própria. Aí está o grande perigo desta liderança virtual mobilizadora. Ela estimula e impulsiona a agir, dando uma direção geográfica para a massa, mas fatalmente pode perder o controle sobre ela, quando esta ganha pernas, fora do facebook.
          O nome Anonymous foi inspirado no anonimato e na forma velada sob a qual os usuários se resguardam. Escondidos pela máscara de Guy Fawkes, usada por V( em V de Vingança), eles nada temem. Resguardado, o indivíduo se sente livre para se manifestar e disseminar conteúdos  e ideologias de toda natureza. As redes sociais se incumbem de catalizar e organizar grupos, movimentos e ações. Trata-se de um fenômeno muito poderoso no seu potencial; o comando é: saia da rede e venha para a rua!

          Já sabemos, historicamente, o que podem fazer alguns líderes ( reais e agora virtuais) que massificam, absorvem e manipulam as mentes com um simples comando. Há que ter cuidado e não se deixar manipular como massa de manobra. Nas passeatas algumas camisas brancas já foram substituídas por camisas pretas. Vamos ver o que prevalece.

          Anonymous é um organismo gigante como um grande polvo e seus tentáculos que se soltam e se fragmentam no momento da ação. “Como um nome de uso múltiplo, indivíduos que compartilham o apelido Anonymous também adotam uma identidade online caracterizada como hedonista e desinibida”. Claro, escondido e resguardado, muitas vezes o indivíduo encontra território fértil para liberar o seu lado mais primitivo, instintivo e agressivo, uma vez que o comando se limita a convocar o agrupamento. Depois que se consegue isto, é cada um por si... Cada um seguindo sua cabeça e impulsos, conforme seus valores. Isso é uma adoção intencional, satírica e consciente do efeito de desinibição online. Sem identidade as pessoas têm ou se sentem com poder e se manifestam livremente, pois não há o medo de serem censuradas, reprimidas ou reconhecidas.
          O que seriam, já que se escondem no anonimato? Uma tribo, uma gangue, uma quadrilha, uma legião com a mesma máscara? Uma das auto-descrições do Anonymous é:  “ Nós somos Anonymous. Nós somos Legião. Nós não perdoamos. Nós não esquecemos. Esperem por nós”**. Muitas destas definições me parecem intimidativas e ameaçadoras. Em uma linguagem anterior às páginas sociais eu lembraria o refrão gritado nas ruas: “ o povo unido jamais será vencido”; muitas vezes a multidão acompanha o fluxo, sem saber ao certo a direção da caminhada. Resta saber quais são os propósitos do povo unido, quando fora do universo virtual. Pode ser um grito de guerra de um cérebro sem harmonia com o restante do corpo, incitando à paz, ou à violência. Afinal, não há compromisso do cérebro com o resto do corpo. Quem determina a direção?
          Anonymous é a primeira super consciência virtual. É um coletivo, no mesmo sentido que um bando de pássaros é um grupo viajando na mesma direção. A qualquer momento, mais pássaros podem entrar, sair, voar para uma direção completamente diferente”. Fica evidente nesta auto definição que eles assumem que perdem o controle e a direção dos voos dos cérebros massificados. Eis aí o grande perigo.“Usamos os modos de comunicação para organizar os protestos”. A partir disto não sabemos o que pode acontecer... E as consequências dos atos dos radicais infiltrados? Quem pagará pelos estragos do vandalismo?
          Anonymous não possui um líder ou partido controlador e depende do poder coletivo dos ativistas em agir de uma maneira que o resultado beneficie o grupo”. De qualquer forma, a partir do momento que convocam a população para as ruas, tudo foge ao controle e nada garante que não sejam desvirtualizados de seus propósitos originários. Nada impede que grupos de interesses diferentes dos pacifistas se infiltrem e deem uma cara de terror ao movimento. Um organismo independente, invisível, como um cérebro gigante, sem nome e sem dono, pode transforma-se em um elemento altamente perigoso, com poder, em tese, para o bem e, no mundo real, com muito poder também para o mal. Quem decide a cara do movimento é o povo!
          Cuidado! Um cérebro sem rosto pode ter uma aparência assustadora. E, querer dar nome aos bois, quando a boiada está solta em disparada, é impossível.

Valéria Áureo 
19/06/2013

*Alusão  ao filme O Grande Ditador, onde Chaplin vive uma brilhante sátira a Adolph Hitler.
**[We Are Anonymous, We Are Legion], Yale Law and Technology, 9 de Novembro de 2009.
( Origem: Wikipédia)